14 de mar. de 2013

Desculpa Moço - Capítulo 5


Após ler aquela carta encostei-me na poltrona e fiquei em silêncio por um segundo. A tarde estava cinza como o meu vestido, e não acreditei quando segurei aquela carta em minhas mãos. Só tive tempo de me trancar no quarto e mergulhar na profundidade daquelas letras que atadas umas as outras transportaram toda a essência dele até meu quarto. Seus olhos, sua boca repetindo cada frase para evitar eufemismos, e um fragmento de sua candura em cada pedaço daquele papel branco. Foi ali, na solidão de um quarto escuro que senti o quanto eu ainda o amava. Que em nenhum momento desisti de amá-lo e que a leve paz que senti durante os últimos meses foram apenas uma prova que a paixão ardente de outrora havia tomado chá às cinco e descansado na poltrona esperando a efemeridade passar. É amor tudo o que sinto, e ele parece sentir mais que eu. Porque ele ficou, mas eu corri para bem longe. Não consegui enfrentar meu próprio afeto, e por isso escolhi a fuga. Aqui estou sem ele, tudo o que tenho é esta carta e um coração aflito. Porque temo por nós dois após ler esta linda carta. Eu quero voltar para casa, sentir seu abraço e amá-lo profundamente. Mas, tenho uma nova vida para construir nesse lugar. Lá eu serei apenas mais uma moça prendada que cuida do marido e dos filhos...aqui eu serei uma verdadeira mulher. Talvez encontre um amor, desses que nos aquecem no fim da noite e nos beijam antes de ir ao trabalho. Desejo outras coisas, quero trabalhar e fazer faculdade de Direito, me formar e ter meu próprio automóvel. Quero crescer, mesmo sem ele por perto. Eu devia estar alegre agora, chorando de felicidade e comprar passagens de volta para o lar. Mas eu não vou voltar. Meu lugar é aqui agora, ele deve saber que eu não sou mais a mesma, e que o amor que eu dizia sentir naquela carta chuvosa está tão crescido que não precisa mais do outro para existir e se prolongar. Eu não sei o que escrever como resposta, temo magoá-lo com a minha aspereza, mas a sinceridade é a maior demonstração de amor. Acho que a sopa esfriou no meu prato, junto com as flores que um dia em mim floresceram. Estou tão confusa...Não sei se guardo ou rasgo esse pedaço de alma, será amor o que ainda arde em meu peito? Será que este coração ainda arfa por ele? Se ainda pulsasse seu nome eu não exitaria em ir em busca de seu abraço. Não eu não devo voltar. Ficarei comigo mesma, aqui é o meu verdadeiro lar.

Ela ligou o vinil e começou a escutar uma música que dizia tudo o que ela estava sentindo naquele instante...

"Eu, toda vez que vi você voltar. Eu pensei que fosse pra ficar.E mais uma vez falei que sim.Mas já depois de tanta solidão. Do fundo do meu coração. Não volte nunca mais pra mim.Se você me perguntar se ainda é seu,Todo meu amor, eu sei que eu,Certamente vou dizer que sim.Mas já depois de tanta solidão. Do fundo do meu coração, Não volte nunca mais pra mim"





3 comentários:

Anônimo disse...

Esperei ansiosa esse texto e confesso que ele me surpreendeu.
Esperava que a mocinha fosse ceder a carta e fosse voltar correndo,mas não! Ela se manteve firme,ela aprendeu a se amar primeiro,a se valorizar.
Confesso que estou encantada e posso ver um pouco de mim nessa história.
É muito bom amar intensamente. Mas quando somos magoadas,a mágoa vem intensamente também. Até que chega um momento em que as Àguas Purificadoras nos lavam e nos damos conta de que devemos nos amar.
Fiquei super orgulhosa dessa moça e feliz comigo mesma por ver um pouco de minhas atitudes nessa moça.
Parabéns borboletinha!
Está alçando altos voos! :D

Karine Maciel (sua eterna leitora)

António Je. Batalha disse...

Ao passar pela net encontrei o seu blog, estive a ler algumas coisas e posso dizer que é um blog fantástico,
com um bom conteúdo, dou-lhe os meus parabéns.
Se desejar faça uma vista ao Peregrino e sevo e deixe o seu comentário.
Sou António Batalha, do Peregrino E Servo.

Alexandre Lucio Fernandes disse...

Conformismo que vem sob intensa mágoa. É importante se conhecer, focar em si. Acho que é sempre um momento de se encontrar e rumar independente pela felicidade. É amar a si, mesmo que as torrentes do sentimento ainda desaguem lágrimas.

É uma escolha. E escolhas sempre são difíceis.

Beijo!